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CPT pede justiça para caso de família assassinada em São Félix do Xingu

Em 40 anos, município contabiliza 62 mortes sem que ninguém seja responsabilizado. Leia a íntegra da Nota Pública divulgada nesta quinta-feira, 13.

Há 2 anos - por Redação
CPT pede justiça para caso de família assassinada em São Félix do Xingu
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Pará e a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), com o apoio de dezenas de organizações e movimentos sociais, divulgaram nesta quinta-feira (13), uma nota pública exigindo providências para que mais um massacre no campo não fique impune.
 
No último domingo (09), os corpos de José Gomes, o Zé do Lago, sua esposa Márcia Nunes e sua filha Joane Nunes, foram encontrados na propriedade da família, em São Félix do Xingu (PA). A família já residia no local há mais de 20 anos, desenvolvia trabalhos de preservação da floresta e mantinha um projeto de reprodução de tartarugas. Eram conhecidos e reconhecidos pelo trabalho ambiental que faziam. A terra ocupada por eles está em área de jurisdição do ITERPA e inserida na APA (Área de Preservação Ambiental) Triunfo do Xingú, com mais de 1,5 milhão de hectares.
 
A nota ressalta que o município tem histórico de conflitos fundiários graves "resultantes de ações de grilagens de terras públicas, desmatamento ilegal voltado à atividade da pecuária extensiva, invasões de terras indígenas e áreas de preservação, além da instalação de garimpos ilegais". Nos últimos 40 anos, 62 trabalhadores rurais e lideranças foram assassinados, sem julgamento e condenação para qualquer destes crimes.
 
Duas representações foram protocoladas pela SDDH, com relação ao caso, cobrando providências. A primeira à Secretaria de Segurança do estado do Pará (SEGUP), ainda na segunda-feira(10), a segunda foi protocolada na manhã de hoje (13) à Procuradoria Geral do Estado.
 
Confira a Nota Pública na íntegra:
 
 

Mais um massacre no campo não pode ficar impune!

 
No último domingo, os corpos de JOSÉ GOMES, conhecido como Zé do Lago, de 61 anos, sua esposa MARCIA NUNES LISBOA, 39 anos e de sua filha JOANE NUNES LISBOA, 17 anos, foram encontrados na propriedade da família, na ilha da cachoeira do Mucura, localizada às margens do rio Xingu, no município de São Félix do Xingu, Pará. Os três foram assassinados a tiros. A Polícia Civil esteve no local e recolheu 18 cápsulas das armas utilizadas no crime. Pelo tipo de arma, pela quantidade de tiros disparados, por não ter sido levado nenhum pertence da família, pela forma como os assassinos surpreenderam as vítimas não permitindo que alguém corresse e tentasse escapar, trata-se de uma execução, provavelmente, a mando de alguém.
 
A família de José Gomes já residia no local há mais de 20 anos, desenvolvia trabalhos de preservação da floresta e mantinha um projeto de reprodução de tartarugas. Eram conhecidos e reconhecidos pelo trabalho ambiental que faziam. A terra ocupada por eles está em área de jurisdição do ITERPA e inserida na APA Triunfo do Xingú, uma área de preservação com mais de 1,5 milhões de hectares. Nos últimos anos o desmatamento para exploração de madeira e criação extensiva do gado, tem avançado de forma descontrolada dentro da reserva, se aproximando cada vez mais da região onde a família de Zé do Lago tinha sua propriedade. Até o momento, a Polícia Civil do Pará, que investiga o caso, não apresentou qualquer resultado que indique quem foram os executores e quais as causas que motivaram os crimes.
 
O município de São Félix do Xingu é conhecido por conflitos fundiários graves resultantes de ações de grilagens de terras públicas, desmatamento ilegal voltado à atividade da pecuária extensiva, invasões de terras indígenas e áreas de preservação, além da instalação de garimpos ilegais. Esses conflitos têm resultado em assassinatos de lideranças, chacinas e trabalho escravo. Conforme dados da CPT, nas últimas quatro décadas, 62 trabalhadores rurais e lideranças foram assassinadas no município em conflitos pela posse da terra. Em nenhum dos casos houve julgamento de algum responsável pelos crimes, portanto, a taxa de impunidade é de 100%. Até o momento, não temos informações se o crime tem motivação agrária, caberá à Polícia do Pará esclarecer as reais motivações da chacina. Apenas no estado do Pará, nas últimas quatro décadas, a CPT já registrou 29 massacres com 152 vítimas.
 
No mesmo período, 75 lideranças foram assassinadas no sul e sudeste do Estado. Uma delas foi o sindicalista Ronair José de Lima, assassinado no município de São Félix do Xingu em 04/08/2016, cujos responsáveis pelo crime continuam impunes.
 
O que preocupa os movimentos e entidades de direitos humanos são as limitações dos órgãos de segurança pública do Estado em esclarecer as responsabilidades e causas de muitos assassinatos ocorrido no campo paraense. Em maio de 2021, a CPT e SDDH apresentaram à SEGUP, uma relação de 9 lideranças camponesas, assassinadas entre 2017 e 2021 apenas nas regiões sul e sudeste do Estado em que os crimes não tinham sido ainda esclarecidos e os responsáveis identificados e punidos. O secretário de Segurança Pública solicitou 15 dias para dar uma resposta, mas, passados oito meses, nenhuma resposta foi dada. Entre os casos relacionados está o de Fernando dos Santos Araújo, assassinado em 26/1/2021, na fazenda Santa Lúcia, município de Pau D’Arco. Ele era um dos sobreviventes e testemunha chave do massacre de Pau D’Arco, crime ocorrido em 24 de maio de 2017. Quase um ano depois do homicídio, o delegado que presidiu as investigações concluiu o inquérito sem esclarecer as causas que motivaram o crime.
 
No mesmo documento, as entidades apresentaram também uma relação de 8 mandados de prisão preventiva, decretados contra executores e mandantes de assassinatos no campo, que se encontram foragidos. Nesse período, apenas um mandado foi cumprido. Entre os foragidos estão: o fazendeiro Marlon Lopes Pidde, mandante da chacina de 5 camponeses, crime ocorrido em 27/09/1985, no município de Marabá (PA). Em Júri ocorrido em 8/5/2014, Marlon foi condenado a 130 anos de prisão, mas nunca foi preso para cumprir a pena. Outro caso apresentado foi do fazendeiro José Rodrigues Moreira, mandante do assassinado do casal de extrativistas José Claudio e Maria, crime ocorrido em 24 de maio de 2011, no município de Nova Ipixuna (PA). Condenado a 60 anos de prisão em julgamento ocorrido em 6/12/2016, José Rodrigues nunca foi preso para cumprir a pena.
 
A preocupação das entidades é que com o descaso da segurança pública do Estado em esclarecer a autoria e motivação dos crimes e prender os responsáveis, esse possa ser mais um caso em que as verdadeiras causas que motivaram os crimes não sejam esclarecidas e os responsáveis permaneçam impunes.
 
Os representantes das organizações que assinam essa Nota esperam que o caso seja rapidamente esclarecido, devendo ser delimitada a dinâmica dos fatos referentes à chacina, a motivação dos envolvidos, todos os responsáveis identificados, presos e devidamente julgados pelo Poder Judiciário; que seja garantida a segurança e proteção para familiares e testemunhas que possam ajudar com informações para esclarecer os crimes.
 
 
 
Belém (PA), 13 de janeiro de 2022.
 
 
 
Comissão Pastoral da Terra – CPT Regional Pará
 
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH

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