Leigos e protagonistas
Eles representam a maioria absoluta entre os membros da Igreja Católica (a exemplo do que acontece nas demais Igrejas cristãs). Pouco valorizados no passado, foi a partir do Concílio Vaticano 2º e, na América Latina, especialmente a partir das assembleias episcopais de Puebla e Medellin, que as e os leigos passaram a se projetar mais fortemente não só dentro da própria instituição como se tornaram “Igreja viva e atuante” naqueles ambientes e meio supra eclesiais, nos quais, a propósito, estão presentes cotidianamente. Com efeito, neste mês dedicado às vocações e, nesta semana em especial, às e aos leigo, é fundamental evidenciar e celebrar o papel dessa multidão de anônimos responsáveis por sustentar a Igreja, inclusive em muitos locais onde carece a presença do clero.
Assim, nos âmbitos da economia e trabalho, da família e da educação, das artes, das comunicações e da política, entre outros, os leigos, enquanto Igreja, buscam testemunhar o Evangelho, de forma concreta, seja individual, seja coletivamente.
O protagonismo social, político, cultural e, portanto, não apenas religioso – desafia todos nós, especialmente numa realidade em que uma grande parte das pessoas parece ainda esperar que a redenção da própria vida em sociedade seja feita por alguns “iluminados”, os tais “salvadores da Pátria”. Ou ainda que está fortemente condicionada por uma mentalidade excessivamente hierárquica.
Há muitas razões, historicamente construídas, que tendem a justificar esse quadro. Detenho-me, aqui, apenas numa delas e específica do ambiente eclesial: o clericalismo, cuja característica central é a influência determinista e dominante do clero sobre a vida da comunidade eclesial cujos resultados costumam ser prejudiciais para a vida comunitária (é o caso dos contínuos conflitos). Essa marca é justificada, entre outros fatores, pela postura autoritária de alguns ministros e omissão dos leigos (dentro e fora da Igreja), mas também pela má compreensão de ambos sobre os papeis que possuem na vida da comunidade religiosa. Papeis que, a propósito, deveriam ser harmoniosamente realizados.
É evidente que, sendo confiado ao clero o papel de liderança, sua voz deve ser especialmente ouvida. Mas é bem verdade também que o modelo de liderança proposto por Cristo é aquele em que a autoridade está fundamentada no serviço ao semelhante. Da mesma forma, onde há um cristão que assim se confesse como tal, ali está a Igreja. Ou seja, ali, ele age e fala em nome da sua fé e, portanto, também da sua Igreja.
Por isso, além de coragem e iniciativa, esse protagonismo exige autonomia da parte de quem deseja fazer deste mundo o Reino de Deus. Mas talvez exija também da própria Igreja hierárquica – ou de parte dela – rever a formação religiosa que é oferecida aos seus leigos, desde a catequese. Dialogar com quem pensa diferente, ser menos autorreferencial e ir além de uma postura apenas devocional poderiam ser metas dessa formação. A mim parece ser justamente a linha de pensamento e testemunho do papa Francisco.
Luis Henrique Marques
Jornalista e editor-chefe das revistas Cidade Nova e Ekklesía Brasil, da Editora Cidade Nova. É mestre em comunicação e doutor em história pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e tem pós-doutorado em comunicação pela Faculdade Casper Líbero. Foi secretário da Diretoria da SIGNIS Brasil no triênio 2020-2022 e editor-chefe da Agência SIGNIS. Blog profissional: prof-luis-marques.webnode.com
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