Uma Igreja que se mobiliza em favor da humanidade
Ainda há quem pense, mesmo atuando numa paróquia desde sempre, que a ação da Igreja deve se limitar a questões estritamente religiosas. É evidente que cuidar da catequese, da administração dos sacramentos e das diferentes celebrações litúrgicas é um compromisso de quem faz parte da comunidade eclesial. Mas limitar-se a isso é condenar a Igreja a fechar-se em si mesma e, sobretudo, a não cumprir a missão pela qual ela existe: ser testemunha do Evangelho e contribuir para a construção do Reino de Deus, segundo o projeto de Jesus Cristo, desde aqui, nesta terra.
Evidentemente, isso não significa, por outro lado, que nossa ação pastoral deve ignorar a intervenção da graça de Deus que é, afinal, quem de fato constrói o Seu Reino. Nem deve se orientar a um ativismo que tende a nos esgotar e produzir poucos frutos. A nós, seus filhos, cabe apenas o papel de colaborar com a obra de Deus. Isso implica afirmar que, na Igreja, não há espaço para ideologias, sejam de direita, de esquerda, sejam de qualquer outra origem. Essa obra não carece de ideologias.
O fato é que isso implica sermos sempre mais generosos e corajosos na nossa práxis pastoral, ousando “sair” dos nossos domínios (ou da nossa zona de conforto, se preferirem) para atuarmos em frentes em que encontramos aquelas pessoas – nossos irmãos, já que somos todos filhos do mesmo Pai – que muitas vezes estão distantes da Igreja e que, mais do que se inserir nas suas estruturas, precisam ser acolhidos para reencontrar, concretamente, o amor de Deus.
Se você, por exemplo, visitar o site oficial da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (www.cnbb.org.br), verá que a Igreja no Brasil atua em muitas e variadas frentes, boa parte das quais vão além das estruturas mais internas como as paróquias e dioceses. São pastorais, organismos e outras entidades que agem em favor das famílias, dos menores, da mulher marginalizada, do povo que vive na rua, dos refugiados, da pessoa idosa, dos afro-brasileiros, da mobilidade humana, dos nômades, dos indígenas, de quem está preso, de quem vive o drama da Aids, da comunicação ética e assim por diante.
O que move as pessoas que se envolvem de forma autêntica com essas pastorais: servir o irmão mais vulnerável, porque “tudo o que fizeres ao menor dos meus é a mim que o fazes” (Mt 25,40). De fato, é fácil falar de amor para quem não vive dramas cotidianos como, por exemplo, o de não saber se vai conseguir comer assim que o dia começa. Amar, nesse caso, é no mínimo dar de comer. Nesse sentido, essa ação pastoral precisa ser também politicamente engajada, na medida em que a construção do Reino de Deus, tarefa que cabe a nós que somos “de Igreja”, exige a mudança das estruturas sociais, políticas, econômicas e culturais da vida em sociedade. Do contrário, somos obrigados a nos constranger com perguntas como aquela que, há muito tempo, vi um menino fazer num vídeo: “Depois que Deus criou o mundo, o que Ele anda fazendo?”.
Artigo publicado originalmente na edição de novembro/2021 da revista Cidade Nova.
Luis Henrique Marques
Jornalista e editor-chefe das revistas Cidade Nova e Ekklesía Brasil, da Editora Cidade Nova. É mestre em comunicação e doutor em história pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e tem pós-doutorado em comunicação pela Faculdade Casper Líbero. Foi secretário da Diretoria da SIGNIS Brasil no triênio 2020-2022 e editor-chefe da Agência SIGNIS. Blog profissional: prof-luis-marques.webnode.com
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